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Há 17 anos atrás

Às 4 da manhã nasceu uma menina muito especial, dentro de uma tenda improvisada. Havia dezenas de pessoas a vigiar o local por fora à espera do fim do parto para poderem presenciar a face da descendente sagrada. O pai sentado à beira da mulher, pronto para finalmente ter a primeira filha, segurava a mão da mulher, pretendendo reter alguma da dor dela.

Ele era Tkeleh, o líder da tribo Semini de Gade ou Descendente de Gade, localizada na Amazónia. Este clã foi fundado há milhares de anos atrás, sendo até a certo ponto conhecido como uma das doze tribos de Israel, onde era chamado apenas de tribo de Gade. O mundo só conhecia sobre as origens deles até ao século VIII a.C., onde as invasões assírias que derrubaram a Samaria tiveram lugar. Mesmo sendo uma tribo lutadora ficaram assustados o suficiente para se esconderem, e protegerem o que acreditavam. Não podiam ser o centro das atenções ou seriam caçados e mortos, e, portanto, encontraram dificuldades em espalhar a sua fé e aumentar a sua irmandade. E assim continuarem até não terem mais força de vontade.

Por volta da altura em que começavam a desesperar ouviram o rumor de que uma criança sagrada havia nascido. Profetizada por David, iria ser conhecida como Messias e traria várias graças ao mundo. A tribo, em vez de aceitar a notícia como algo bom, tomaram-na como um grande insulto à sua fé. Eles sabiam que Deus não se iria mostrar dessa maneira, não através de um filho, já que era imortal pensavam que não havia necessidade de descendência humana Dele. Não faria sentido nenhum e por isso, vendo que o mundo à sua volta parecia estar a criar crenças cada vez mais loucas, decidiram continuar à procura com o dobro do vigor para provarem aos outros que estão certos.

Levaram todos os ensinamentos conhecidos à letra, tentando descobrir algo que os pudesse elevar acima dos outros. Pensaram durante várias décadas com várias tentativas na procura do sucesso, à procura da árvore que falou com Moisés com a voz de Deus, dos soldados que deviam estar mortos no fundo do Mar Vermelho, ou de qualquer registo credível o suficiente para fazer qualquer acreditar. Foi aí que chegaram a uma conclusão. Uma das razões para as pessoas serem crentes e exercerem a sua fé era para poderem ser perdoados dos seus males e poderem ir para o Jardim de Éden. Então era esse local que precisavam de encontrar. Recordaram que o mundo começou com Adão e Eva e que, no pouco tempo que tiveram antes de se encontrarem com a serpente e estragarem tudo, eles viviam no Paraíso. Começaram a investigar locais inexplorados na altura, partindo em viagens à procura de campos verdejantes de beleza inimaginável. Mesmo no meio de tanto deserto não se privaram de prosseguir. Por isso é que saíram do deserto.

Durante vários séculos exploraram o mundo, tentavam embarcar em todas as viagens para procurar o desconhecido, indo como marinheiros. Devido a isto o número de pertencentes da tribo, que ia aumentando por gerações, também diminuía com todos os naufrágios da altura. Mas tudo valeu a pena quando, sob a autoria de Pedro Álvares Cabral descobriram o Brasil. Inicialmente, parecia não haver nada de especial relevo, visto que tinham apenas chegado lá e não explorado. No entanto, após quase 40 anos, foi divulgada a grandiosidade e verdura da Amazónia. Os Semini de Gade, sabiam que tinham que ir para lá. Partiram uns de cada vez, investigando a selva, observando a incrível variedade de fauna e flora, e o quanto se assemelhava ao tão desejado Jardim de Éden. Encontraram uma caverna ótima com uma grande área repleta de árvores de fruto e animais pouco agressivos. Lá seguiram um regime monárquico, já estabelecido na Europa. Já há algum tempo que optaram por seguir esse regime, tal como Salomão, Saúl e David tinham feito antes deles. O chefe fora escolhido por mérito, de modo a definir justamente quem iria estabelecer os objetivos do clã, os costumes a seguir, geria os recursos e garantia a segurança do seu povo. Ao longo de gerações fora sempre a mesma família, já que parecia ser a mais acertada para o trabalho.

Portanto, em 1998, uma menina, filha do rei dos Semini de Gade, nasceu. O pai, já com 54 anos, estava ao mesmo tempo alegre, desapontado e destroçado. Contente por, após tantas tentativas em ter um filho, finalmente conseguir, e desiludido por ser rapariga. A não ser que conseguisse ainda ter outro filho, o que era muito improvável, esta poderia ser a primeira mulher a reinar a tribo. Por outro lado, nasceu a 25 de Dezembro, o que para eles foi uma horrível coincidência, já que era o mesmo dia que o "falso" filho de Deus tinha nascido. Por último, estava destroçado por ver a sua mulher a morrer. A esposa dele também já era velha demais para um parto, com pouco mais de 56 anos, e não aguentou o momento. Morreu a trazer a milagrosa filha Ester, cujo nome inspirado em uma mulher que livrou o povo judeu de um pogrom'.

Ester, como filha de um rei, teve uma vida nobre, repleta de vários deveres. Até aos cinco anos teve uma vida de certa maneira fácil, sendo a primeira a ser alimentada quando caçavam os mantimentos, dormia sempre na cama de rede mais confortável e, por falta de mãe, tinha uma grande variedade de leite mamário. A partir dos cinco anos teve que começar a aprender a proteger-se. Não querendo dar uma arma demasiado perigosa, decidiram educá-la em direção das artes marciais, começando por aprender Krav Maga. Houve alguma dificuldade em aprender, devido à força bruta necessária para a poder usar corretamente, por isso focou-se em aprender sobre tudo o que podia da fé judaica. Aos sete anos conseguiu aperfeiçoar à sua maneira o Krav Maga e foi-lhe dada a primeira arma. Uma clava, neste caso, um bastão de ferro com quatro lâminas em forma de M no topo, ao longo de trinta centímetros. Era toda prateada e assentava como uma luva na mão da rapariga, agora com suficiente força e precaução para a usar. No entanto era sempre tida como uma arma tradicional e simbólica e, portanto, infelizmente não foi ensinada a usá-la, uma vez que seria a primeira a carregar tal arma. O resto da tribo utilizava ou arcos ou facas para combater ou, normalmente, para se subsistirem.

Ela aprendeu tudo o que tinha direito e, mesmo com todas estas atividades, pensava no seu clã. Principalmente no seu pai, que, já com mais de sessenta anos e devido à falta de medicamentos ou prevenção de doenças, estava gravemente doente. O homem ia parar várias vezes a uma rede hospitalar dentro de uma tenda, para ser tratado pelos índios curandeiros. Estes tentavam ajudar os pacientes através da oração, o que várias vezes não era o suficiente. Ester, de cada vez que ouvia falar de alguma coisa má a acontecer com o pai, procurava por ele. Um dia foi à tenda onde estava a ser hospedado, parecendo dormir calmamente, e falou preocupada:

- Então pai. – Abanou-o um bocado até o acordar. – O que é que aconteceu? Estás bem?

Tkeleh abriu lentamente os olhos, espreguiçando-se e olhando para a filha com um sorriso.

- Claro que estou bem filha, não precisas de te preocupar. Não me lembro muito bem de como cheguei aqui, só sei que o que quer que seja não deve ser grave.

- Ouvi dizer que desmaiaste a meio de uma caçada. Já é a terceira vez esta semana, começo a ficar preocupada.

- Ester, eu tenho Deus a meu lado, e com Ele aqui sei que nada de mal me acontecerá.

- Pai, eu percebo, mas tenho aqui umas ervas que, ao ler um dos livros dos forasteiros, parece ter exatamente as mesmas características de uma planta capaz de curar esses teus desmaios. Basta esmagá-los um pouco com água e acho…

- Ester. – O pai olhou para ela com franqueza, observando os olhos verdes que a relembravam tanto a mãe. – Fico grato por finalmente começares a ler, mas essa não era a mensagem que queria que retirasses. Essas tuas ervas não irão mudar o meu destino. Se Deus quiser que eu morra, então eu morro.

- Isso parece injusto. Estás a dizer que não devemos fazer nada para nos mantermos saudáveis? Isso é como se dissesses que não precisávamos de caçar, porque Deus dar-nos-ia alimento, caso tivéssemos fome.

- Tu ainda não percebes. És muito nova.

- Mas… - Quis retorquir até ser interrompida.

- Mas nada. Vai lá para os teus treinos e reza pelo teu pai. Vais ver que daqui a nada, estarei a correr e a caçar como ninguém.

Ester sentia-se ignorada. Ela tivera sempre várias ideias novas para melhorar qualquer aspeto da vida do seu clã, desde misturas de plantas para curar doenças a tentar forjar armas através de chamas controladas. Todos estes pensamentos vinham dos ensinamentos do pai, constituído por parte do Antigo Testamento e várias escrituras de líderes anteriores dos Semini de Gade. O único problema era que, apesar de referirem invenções daqueles tempos passados, também explicam a razão para não as usarem. O objetivo deles era recriar os tempos iniciais, até chegarem ao estilo de vida de Adão e Eva, para encontrarem o Paraíso, logo, como o objetivo era regredir, porque é que iriam avançar? A rapariga sentia-se excluída e não ajudava nada o facto de ela poder ver demónios.

Desde nascença que conseguia ver estas criaturas humanoides, em constante mudança. Tinham uma cor escura, como se fossem uma sombra no meio do ar, e a aparência dependia do estado de espírito da pessoa que o tinha. Cada pessoa tinha o seu demónio interior que se revelava quando uma pessoa agia da forma errada, tinha a forma de um touro quando alguém se zangava, a de uma caveira quando matavam os animais caçados e a de uma hiena quando alguém cobiçava outro. Inicialmente ficava assustada. Ainda em bebé, chorava de cada vez que via um, deixando as pessoas a ponderar sobre o que se passava. Não demorou muito a habituar-se e, a certa altura, a comunicar com eles.

Como gostava de ajudar as pessoas, quis tentar libertá-las dos seus males. Aos quatro anos aproximava-se deles e dizia-lhes para saírem dali. Claramente que não resultou. Aos sete anos, tentou lutar com eles através do seu Krav Maga, todavia eles contra-atacavam com mais força. Ela parecia não ter qualquer efeito neles e, por isso, quando foi falar com o pai ficou preocupada. Ela viu um demónio com a aparência de uma lagartixa gigante. Isto para ela significava que estava com medo, provavelmente da sua morte.

Começou a dedicar-se em encontrar uma medida contra estes seres. Como falar com os próprios monstros não parecia ter resultado, tentou falar diretamente com a pessoa que os tinha. Todavia os demónios chegavam tão fundo até aos sentimentos das pessoas que afetá-los era complicado, principalmente quando as pessoas eram incrédulas. Como cresceu e tinha como arma uma clava, tentou bater-lhes outra vez e até que conseguiu lidar com eles, pelo menos não a magoaram. No entanto não eram afetados por nenhum dos ataques, logo parou de tentar.

Já estava a ficar farta de não conseguir fazer nada, até que veio o dia em que tudo mudou.

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