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EPÍLOGO

uatro anos se passaram. E Bia chegou aos quarenta anos, a idade da renovação.

Nesses quatro anos, convivera em plena felicidade com sua Nika.

Aos vinte e três anos, a cada dia mais bela, por muitas vezes nas ruas, quando caminhavam de mães dadas, eram confundidas com mãe e filha.

Isso não incomodava a Bia, que nesse momento apenas sorria. Ela sabia da profundidade do amor que unia as duas.

Para quem durante toda a vida fora submetida a tantos sofrimentos, tanto abandono e mesmo assim, superara os preconceitos, esses eram apenas detalhes insignificantes

Na clínica, conseguira o antigo posto de secretária executiva de volta.

Prestara vestibular para Assistência Social, sendo aprovada.

Quando pudesse exercer a profissão, ajudaria a muitas pessoas que sofressem repressão como ela sofrera. Talvez conseguisse evitar tantos males...

Aline e Maira estariam colando grau nesse ano e prestavam serviços voluntários de informação e prevenção à AIDS.

Depois de formadas, pensavam em abrir uma clínica de enfermagem.

Allan casara novamente e Bia se sentia muito feliz por isso.

No íntimo sabia que não poderiam reunir toda a família para um almoço de domingo...

Mas o tempo, Senhor de tudo, colocaria tudo em seus devidos lugares. Quando a hora certa chegasse.

Procurou saber notícias de seu pai e soube, muito vagamente, que ele havia sido morto na cadeia. A lei das celas não perdoa estupradores.

Sua mãe, provavelmente voltara para a Bahia. Isso na realidade não importava muito.

Os pais dela não haviam deixado um bom legado. Devia apenas a dura lapidação que sofrera durante os dez anos em que vivera com eles.

Ficou encantada quando soube que Aline e Maira haviam inaugurado a clinica e resolvido casar.

Cris e Marina, ainda morando com o pai, comunicaram que em breve ganhariam um irmão.

E Bia resolveu tomar coragem e pedir Nika em casamento também. Notícia essa que ela recebeu com pulos de alegria.

Percebeu que sua filha não guardara nenhuma mágoa, quando ela propôs que os dois casamentos fossem realizados no mesmo dia.

Bia havia superado a repressão, o preconceito aos portadores do vírus HIV, a diferença de idade, o abandono, o ódio...

Havia mesmo da maneira mais cruel, soltado as amarras de Allan, que encontrara em sua vida alguém que o amasse de verdade e que não fosse apenas grata a ele.

A gratidão pelo que ele fez por ela, ficaria para sempre, assim como os elos formados pelas três filhas.

E se um dia, ele, assim como as filhas, aceitasem o seu relacionamento com Nika, as portas de sua casa estariam abertas para o irmão e companheiro de tantos anos.

Como pai e avô que sempre seria. Mas esse encontro não deveria ser forçado.

Também disso o tempo se encarregaria.

O filho de Maira não poderia ter outro nome, a não ser o do avô. E como Allan Neto, foi batizado.

Os casamentos foram realizados no cartório do bairro.

Talvez ainda demorasse para que as igrejas aceitasem a união entre pessoas do mesmo sexo.

Talvez por anos, ainda permanecessem de olhos fechados aos casos de pedofilia que ocorriam dentro delas próprias.

Para as quatro mulheres, agora unidas oficialmente pela lei, importavam os seus sentimentos.

Allan Neto tinha uma grande e vitoriosa familia... Duas mães, duas ou três avós, tantas pessoas, numa maravilhosa confusão de laços, enfim, numa maravilhosa diversidade.

Depois na casa de Bia, uma celebração simples, e a presença das filhas, que trouxeram sua nova família para apresentar.

Um longo e fraterno abraço, sem culpas nem rancores, uniu Bia e Allan.

Depois de uma semana de casada, Nika e Bia souberam que em um orfanato, alguém havia abandonado uma criança.

Em sua vida de desafios constantes, Bia resolveu entrar na fila de adoção. No peito, a certeza da vitória.

A vida estava trazendo de volta para ela todos aqueles a quem amara, mesmo em alguns instantes não sabendo demostrar.

O espelho dos seus pesadelos fora quebrado. E após um negro passado reprimido, a vida se apresentava enfim, cheia de luzes e cores.