No gélido e sitiado Reino do Inverno, a Princesa Letícia é forçada a um casamento arranjado para salvar seu povo da fome e da ruína. Escoltada em sua jornada pelo enigmático e habilidoso cavaleiro Aleph, ela se vê mergulhada em um turbilhão de perigos inesperados, onde shineideas a serviço de uma rainha sombria espreitam nas sombras e segredos ancestrais sobre seu próprio poder como uma lendária Guardiã da Natureza começam a despertar. Enquanto um amor proibido floresce em meio a batalhas e revelações chocantes sobre traições que atingem o coração de sua própria família, Letícia e Aleph devem navegar por intrigas palacianas, conspirações que ameaçam desestabilizar reinos inteiros e descobrir a verdade por trás de um complexo plano que pode ser a única esperança contra as trevas que avançam. Entre o dever para com seu povo e os anseios de seu coração, Letícia precisará encontrar força em seus poderes recém-descobertos e nos aliados inesperados para enfrentar um destino que pode custar tudo o que ela ama.
O Reino do Inverno estendia-se sob um manto de tranquilidade gélida, onde imponentes montanhas, cobertas por gelo eterno e árvores cristalizadas pela neve erguiam-se em direção ao céu. Lagos começavam a congelar sob o toque do solstício de inverno, prenunciando a estação que reinava soberana naquele reino.
Na capital, alheia ao frio cortante que se avizinhava, uma jovem de cabelos negros e olhos azul-claros examinava flores com cuidado em uma pequena e movimentada floricultura. Seu nome era Letícia, Princesa do Inverno, embora ninguém ali, sob seu disfarce simples, a reconhecesse. Enquanto fingia concentrar-se nas pétalas de uma rosa, seus ouvidos atentos captavam a conversa animada das funcionárias.
— Imaginem só! A princesa Letícia vai se casar com o príncipe do Outono! — disse uma delas, com um suspiro sonhador.
— Eu queria tanto ver o casamento! — lamentou outra. — Mas será em outro reino... Queria ver a princesa com o vestido de noiva... dizem que os vestidos do Reino do Outono são os mais deslumbrantes! — E, embalada pela fantasia, rodopiou com um buquê de rosas, imitando uma valsa nupcial.
— Será que o príncipe é bonito? Se for, ela deu muita sorte! — comentou uma terceira, enquanto organizava uma pilha de flores.
— Bobagem! — interveio uma funcionária mais velha. — Não basta ser bonito, tem que ser cavalheiro! Vocês são jovens demais para entender essas coisas.
Letícia sorriu discretamente. Tendo escolhido suas flores, aproximou-se do balcão, onde Verônica, a dona da floricultura, a atendeu com um sorriso acolhedor.
— São para quem, senhorita?
— Para minha mãe. Poderia colocar um laço vermelho? Era a cor preferida dela.
Após pagar, a jovem deixou a floricultura com um último olhar discreto. Mal sabiam elas que era justamente dela que tanto falavam.
Letícia seguia seu caminho pela rua movimentada, mal deu o seguinte passo, um estrondo a fez paralisar. Um pesado vaso de flores, vindo do alto de um prédio, espatifou-se no chão, exatamente onde segundos antes se encontrava. O coração disparou. Aquilo seria coincidência? Ou um aviso? A multidão ao redor expressou preocupação e alívio, mas Letícia sentiu um calafrio percorrer sua espinha.
O Reino do Inverno, seu lar, enfrentava tempos sombrios. O clima hostil dificultava a agricultura, obrigando-os a recorrer a frequentes trocas comerciais, especialmente com seu principal aliado econômico: o Reino do Outono.
Contudo, a má gestão do Rei durante a última colheita havia lançado o reino em uma crise econômica profunda. Para salvar seu povo da fome e da ruína, o monarca viu-se forçado a recorrer ao próspero Reino do Outono. A ajuda, porém, vinha com um preço: o cumprimento de um antigo acordo que selava o destino da Princesa Letícia. Recém completados seus dezoito anos, ela seria entregue em casamento ao Príncipe Ryuuji, do Outono, consolidando uma aliança política crucial para a sobrevivência do Reino do Inverno.
Enquanto isso, na floricultura, a conversa havia mudado de foco.
— Senhora Verônica, viu o novo cavaleiro que chegou na cidade? — perguntou uma delas, com os olhos brilhando. — Tem uns 20 anos, rosto de tirar o fôlego, porte atlético, alto... e uma voz encantadora!
— Atlético? Ora, ele é um cavaleiro! É de se esperar — respondeu Verônica, com um sorriso divertido.
— E tem os olhos de um cinza claro incrível! — complementou outra. — Mas ninguém viu a cor do cabelo dele ainda. Ele usa um gorro o tempo todo.
— Com este frio, não é de se admirar — comentou Verônica. — A propósito, onde foram parar aquelas três?
As três funcionárias mais jovens, fascinadas pelo cavaleiro misterioso, seguiam-no disfarçadamente pelas ruas movimentadas.
— Será que ele é careca? — sussurrou uma delas.
— Impossível! — exclamou outra, balançando a cabeça com veemência. — Impossível!
— Vamos descobrir! — declarou a terceira, com um brilho travesso nos olhos. — Vamos dar um jeito de tirar aquele gorro!
E, com um sorriso conspiratório, as três jovens elaboraram um plano para desvendar o mistério capilar do cavaleiro. Uma delas fingiu tropeçar e torcer o tornozelo, enquanto as outras duas a amparavam, aproximando-se do cavaleiro com ares de aflição.
— Senhor cavaleiro, nossa amiga machucou o tornozelo! — exclamaram. — O senhor poderia nos ajudar?
O jovem cavaleiro, com seus impressionantes 1,85m de altura, atendeu prontamente ao pedido. Indicou que a moça se sentasse para que ele pudesse examinar o tornozelo. No entanto, enquanto ele se abaixava, as outras duas aproveitaram a oportunidade e, com um movimento rápido, arrancaram-lhe o gorro. Cabelos curtos, de um cinza prateado reluzente, emolduravam seu rosto, combinando perfeitamente com seus olhos da mesma cor. Um contraste marcante com os cabelos escuros e olhos azuis ou verdes tão comuns no Reino do Inverno.
— Que lindo! — exclamou a moça que fingira o acidente, admirando os cabelos prateados. —Você deveria mostrá-lo mais vezes! Ninguém por aqui tem cabelos assim!
O cavaleiro, visivelmente desconfortável com a situação, respondeu com um tom educado, porém firme:
— Por favor, devolvam meu gorro.
A voz suave e melodiosa apenas aumentou o fascínio das jovens.
Letícia, observando a cena à distância, percebeu o desconforto do cavaleiro e decidiu intervir.
— Senhora Verônica está procurando por vocês — disse, com uma voz clara.
As jovens, envergonhadas, devolveram o gorro ao cavaleiro e saíram correndo.
— Desculpe-me o incômodo que elas possam ter causado — disse Letícia ao cavaleiro, com um leve aceno de cabeça. — Com licença.
O cavaleiro retribuiu o gesto com uma inclinação respeitosa.
Letícia prosseguiu então para o cemitério real, o local de descanso de sua mãe e de gerações de monarcas do Reino do Inverno. Depositou as flores sobre o túmulo de mármore branco e acendeu um incenso de lavanda, a fragrância preferida da rainha Elyza.
— “Em breve partirei para ao reino do Outono, mãe” — sussurrou, a voz embargada pela emoção. — “Saiba que eu sempre me lembrarei dos seus ensinamentos. A saudade que se depara sobre mim com certeza não pode ser aliviada, mas eu farei o possível para seguir em frente apesar de todos os problemas que possam passar pela minha vida de agora em diante. Eu me transformarei em uma princesa que você teria orgulho de presenciar se estivesse aqui ao meu lado.”
Lágrimas silenciosas rolaram por sua face, enquanto uma profunda saudade se deparou sobre ela naquele instante. Após um último adeus, Letícia deixou o cemitério.
Minutos depois, o cavaleiro de cabelos prateados aproximou-se do túmulo da Rainha Elyza. Depositou um ramo de flores brancas ao lado das que Letícia havia deixado.
— Meu pai pediu que eu trouxesse isso — murmurou, com reverência. — É uma pena não ter tido a oportunidade de conhecê-la, Majestade.
Com uma última inclinação, o cavaleiro se retirou, deixando um mistério tão denso quanto a névoa gélida que por vezes cobria o reino.