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A Crônica do Contador de Histórias

Após uma vida de poucas conquistas e repleta de arrependimentos, Vanitas recebe uma segunda chance ao reencarnar como um bebê em um mundo onde magia e espadas fazem parte do cotidiano. Determinado a deixar seu passado para trás, ele abraça essa nova chance, vivendo com uma trupe itinerante de artistas da corte. Entre apresentações e jornadas por novas terras, Vanitas aprimora seu talento nato para o alaúde, mas é na magia que seu verdadeiro poder desperta. Sob a tutela da poderosa Arcanista Marceline, ele mergulha nos segredos da simpatia, a arte mágica que, desde o início, acendeu seu desejo de invocar o vento. No entanto, o destino de Vanitas toma um rumo inesperado quando cruza caminho com o enigmático grupo Sombraim, cujos segredos ocultos trazem à tona verdades sombrias sobre o mundo e sobre sua própria reencarnação. Em busca de respostas, Vanitas parte em uma jornada por terras desconhecidas, onde cada nova descoberta o arrasta ainda mais profundamente para os segredos esquecidos da história. Ao longo do caminho ele encontra aliados improváveis, constrói amizades inquebráveis e se apaixona... mas o que realmente aguarda em seu destino é algo que supera tudo isso. Com a chance de mudar o mundo em suas mãos, Vanitas precisa decidir entre seguir o caminho das revelações ou se perder nos laços do amor e da amizade. O peso dessa escolha pode mudar para sempre o curso de sua vida — e a de todos ao seu redor.

porep · Fantasy
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88 Chs

L. CHIFRE PT.1

Depois que Mestre Hilme dispensou a turma, a notícia do que eu tinha feito se espalhou pela Academia como um relâmpago.

Pelas reações dos estudantes, percebi que o professor não era particularmente popular. Quando me sentei num banco do lado de fora do Cercado, os alunos que passavam sorriram para mim. Outros acenaram ou levantaram o polegar, dando risadas.

Embora a notoriedade me agradasse, uma angústia fria cresceu pouco a pouco em minhas entranhas. Eu fizera de um dos nove mestres meu inimigo. Precisava saber em que enrascada havia me metido.

O jantar no Rancho foi pão de centeio com manteiga, ensopado de carne com legumes e feijão. Monet estava lá, a cabeleira branca e desgrenhada fazendo-o parecer um grande lobo branco. Leif e Balken reclamaram displicentemente da comida, tecendo especulações sombrias sobre o tipo de carne que estaria no guisado. Para mim, saído das ruas de Notrean menos de uma onzena antes, era uma refeição realmente maravilhosa. No entanto, comecei a perder rapidamente o apetite diante do que ouvi de meus amigos.

— Não me entenda mal — disse Balken. — Você tem um par de bagos admirável, isso eu jamais questionarei. Mas, mesmo assim... — Fez um gesto com a colher. — Vão enforcá-lo por isso.

— Se ele tiver sorte — acrescentou Leif. — Quer dizer, estamos falando de uma violação das normas, não é?

— Não foi grande coisa — retruquei, com mais segurança do que sentia. — Esquentei um pouquinho o pé dele, só isso.

— Qualquer simpatia que cause danos se enquadra na categoria das infrações — disse Monet, apontando para mim com seu pedaço de pão e arqueando seriamente as sobrancelhas grisalhas. — Você tem que saber escolher suas batalhas, garoto. Perto dos professores, mantenha a cabeça baixa. Eles podem transformar sua vida num verdadeiro inferno se você entrar no caderninho preto.

— Foi ele quem começou — rebati, mal-humorado, com a boca cheia de feijão.

Um garotinho veio correndo até a mesa. Arfava.

— Você é o Vanitas? — perguntou, olhando-me de cima a baixo.

Assenti com a cabeça, sentindo um bolo repentino no estômago.

— Estão chamando você na Sala dos Professores.

— Onde fica isso? — perguntei. — Faz apenas dois dias que estou aqui.

— Será que um de vocês pode mostrar a ele? — indagou o menino, correndo os olhos pela mesa. — Tenho que dizer ao Jamis que o encontrei.

— Eu mostro — disse Leif, afastando a tigela de ensopado. — Não estou mesmo com fome.

O mensageiro de Jamis foi embora e Leif começou a se levantar.

— Espere aí — disse eu, apontando com a colher para minha bandeja. — Ainda não acabei.

A expressão de Leif foi de ansiedade.

— Não acredito que você esteja comendo. Eu não consigo comer. Como é que você consegue?

— Estou com fome — respondi. — Não sei o que me espera na Sala dos Professores, mas acho melhor estar com o estômago cheio para enfrentá-lo.

— Você vai para o Chifre — disse Monet. — É a única razão que os levaria a chamá-lo lá a esta hora da noite.

Eu não sabia o que ele queria dizer, mas não estava disposto a anunciar minha ignorância para todas as pessoas da sala.

— Eles podem esperar eu terminar — retruquei, comendo outra colherada do guisado.

Leif voltou para seu lugar e ficou cutucando distraidamente a comida. A bem da verdade, eu já não estava realmente com fome, mas ficara fulo da vida por ser retirado da mesa, depois de ter passado fome tantas vezes em Notrean.

Quando enfim nos levantamos, o falatório normal do Rancho se aquietou, enquanto os colegas nos observavam sair. Sabiam para onde eu estava indo.

Do lado de fora, Leif enfiou as mãos nos bolsos e partiu energicamente em direção ao Conclave.

— Sem brincadeira, você está numa encrenca danada, sabia?

— Eu tinha a esperança de que o Hilme ficasse envergonhado e calasse a boca sobre essa história — admiti. — Eles costumam expulsar muitos alunos? — perguntei, tentando fazer a pergunta soar como uma piada.

— Neste período letivo ainda não saiu ninguém — respondeu Leif, com seu tímido sorriso de olhos azuis. — Mas só estamos no segundo dia de aulas. É capaz de você estabelecer uma espécie de recorde.

— Não tem graça — retruquei, mas me vi sorrindo, ainda assim. Leif sempre conseguia me fazer sorrir, a despeito do que estivesse acontecendo.

Ele orientou o caminho e chegamos ao Conclave depressa demais para o meu gosto. Levantou a mão num adeus hesitante, enquanto eu abri a porta e entrei.

Fui recebido por Jamis. Ele supervisionava tudo que não ficava sob o controle direto dos professores: as cozinhas, a lavanderia, os estábulos, os depósitos de material e mantimentos. Era nervoso feito um passarinho. Um homem com corpo de pardal e olhos de gavião.

Escoltou-me até uma sala grande e sem janelas, com uma mesa familiar em forma de meia-lua. O Reitor estava sentado no centro, como no exame de admissão. A única diferença real era que essa mesa não era elevada e os olhos dos professores sentados ficavam à altura dos meus.

Os olhares com que me deparei não foram amistosos. Jamis conduziu-me à frente da mesa. Vê-la por esse ângulo me permitiu compreender a referência de estar "no Chifre". Depois retirou-se para sua própria mesinha menor e molhou a pena. 

O Reitor ergueu as mãos, juntou as pontas dos dedos e falou sem nenhum preâmbulo:

— No dia dois de catelyn, Hilme convocou uma reunião dos professores.

A pena de Jamis foi arranhando um pedaço de papel, voltando de vez em quando a mergulhar no tinteiro em cima da mesa.

O Reitor prosseguiu, em tom formal:

— Todos os mestres estão presentes?

— Fisiopata-Mor — disse Armin.

— Arquivista-Mor — disse Loran, com o rosto impassível como sempre.

— Aritmético-Mor — apresentou-se Brandon, com um estalar distraído dos dedos.

— Artífice-Mor — resmungou Kelvin, sem levantar os olhos do tampo da mesa.

— Alquimista-Mor — disse Mondrag.

— Retórico-Mor — fez Hilme, com o rosto enfurecido e vermelho.

— Simpatista-Mor — disse Lal Mirch.

— Nomeador-Mor — manifestou-se Elohkar, que me sorriu de verdade. Não foi só um curvar superficial dos lábios, mas um sorriso caloroso, cheio de dentes. Dei um suspiro meio trêmulo, aliviado por haver ao menos uma pessoa presente que não parecia ansiosa por me pendurar pelos polegares.

— E Linguista-Mor — completou o Reitor. — Todos os oito... — franziu o cenho. — Perdão, risque isso. Todos os nove Mestres se encontram presentes. Formule sua queixa, Mestre Hilme.